O contrato que existe para não existir, os R$ 129 milhões que expõem o novo buraco negro ético da República

 

Banco Master, esposa de ministro, contrato sem objeto definido e um silêncio que vale ouro


 

Em tese, e só em tese, não há nada de ilegal em um banco contratar o escritório da esposa de um ministro do Supremo Tribunal Federal. Pode até não ser contra a lei, mas é daquele tipo de situação que faria até um leitor desatento levantar a sobrancelha. E quando o banco em questão é o Banco Master, presidido pelo empresário Daniel Vorcaro, investigado em operações da Polícia Federal e recentemente liquidado pelo Banco Central, bem, aí a história começa a ficar tão indigesta quanto cuscuz com gasolina.

Segundo revelou a jornalista Malu Gaspar, de O Globo, o Master firmou com o escritório Barci de Moraes Advogados, de Viviane Barci de Moraes, esposa do ministro Alexandre de Moraes, e que também inclui dois dos três filhos do magistrado, um contrato simplesmente monumental: R$ 129 milhões, quitados em 36 parcelas de R$ 3,6 milhões. Tudo começando no início de 2024, precisamente no período em que o banco navegava em mares mais turbulentos que canoa furada na cheia do Parnaíba.

Mas qual o serviço? Aí que está, não existe.

O contrato não tinha objeto específico. Nada. Zero. Nenhuma causa definida. Seria para representar o banco “em vários temas, conforme a necessidade”. Em outras palavras, um contrato de R$ 129 milhões com “prestação de serviços conforme aparecerem”, o que, no universo jurídico, soa quase tão convincente quanto nota fiscal de pastel sem pastel.

É o tipo de contrato que existe para não existir. Uma formalidade que tenta posar de relação profissional, mas sem qualquer justificativa técnica. E isso explica por que o assunto caiu como dinamite no noticiário nacional e regional. Afinal, não se trata apenas de um enorme desconforto ético. Trata-se de uma porta escancarada para a suspeita de que escritórios ligados a parentes de ministros do Supremo orbitam interesses de empresas investigadas, criando um circuito de poder tão hermético quanto uma caixa preta de avião.

O silêncio ensurdecedor

Procurados, nem o ministro Alexandre de Moraes, nem o escritório emitiram qualquer explicação. E o silêncio, nesse caso, não é vazio, é ensurdecedor. Porque quando um contrato milionário não tem objeto definido, não tem explicação plausível e não tem defesa pública, restam apenas as perguntas.

E as perguntas são cada vez mais perigosas

Por que razão um banco investigado pela Polícia Federal e recém-liquidado pelo Banco Central destinaria R$ 129 milhões a um escritório de advocacia ligado à família de um ministro do STF?

Quais “temas” seriam esses que justificariam um pagamento mensal superior ao orçamento de muitas prefeituras do interior?

Qual seria o alcance da influência necessária para que um contrato sem objeto pudesse ser firmado com tamanha tranquilidade?

E por que, essa é a pergunta que arrepia Brasília, tanta proteção ao operador do Master, Daniel Vorcaro? O que ele pode revelar?

O roteiro só engrossa

Para completar o enredo, o mesmo período em que o contrato foi firmado coincide com outro fato notório, a compra, pela família do ministro Alexandre de Moraes, de uma mansão de 725 metros quadrados no Lago Sul, por R$ 12 milhões pagos à vista. O dado, revelado pelo site Metrópoles, ajuda a bagunçar ainda mais o quebra-cabeça ético que se formou.

Toffoli entra na roda

O caso também alcança o ministro José Antonio Dias Toffoli, ampliando o alcance do escândalo e fortalecendo a sensação de que o Brasil vive um momento em que decisões judiciais e relações privadas se misturam com a desenvoltura de um suco de frutas.

Não é ilegal, mas é imoral até a raiz dos fios

E é exatamente aqui que mora o ponto central, não há ilegalidade formal, mas há um abismo moral que ameaça a credibilidade do Supremo. Um tribunal que deveria ser o último bastião ético da República acaba, com esse tipo de associação, alimentando suspeitas que corroem a confiança pública.

Se o país já vive uma crise de credibilidade nas instituições, casos como este funcionam como gasolina em uma fogueira.

O caso é grave porque é institucional, não pessoal

O problema não é apenas o contrato.
É que o Supremo permitiu que um ministro permanecesse na Corte mesmo tendo a esposa e os filhos recebendo fortunas de um banco investigado, sem objeto definido, em plena turbulência regulatória.

É a Corte permitindo uma prática que, em qualquer país com mínimo zelo institucional, seria vetada sem pensar duas vezes.

O Brasil merece respostas

O Globo fez o que a imprensa precisa fazer, acendeu a luz. Agora, resta saber se o Supremo terá coragem de olhar para dentro, ou se continuará fingindo que contratos desse tipo são apenas coincidências como chuva em Teresina, inevitáveis, quentes e que todo mundo finge que passa rápido.

O fato é simples, incômodo e urgente:

Um contrato de R$ 129 milhões sem objeto não é um contrato.
É um sintoma.

E esse sintoma aponta para uma doença institucional que o país não pode mais ignorar.




 

 

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